Compra da Amazon troca PS5 de 30 anos por ENTULHO
Em setembro, a Sony anunciou algo muito especial para os fãs: versões comemorativas do PS5, PS5 Pro e acessórios do PlayStation em edições de 30 anos, trazendo cores do PS1 em itens extremamente limitados. Essa baixa oferta gerou uma demanda alta para quem queria comprar, afinal, perder a pré-venda resultaria em comprar de revendedores por um preço muito maior.
Lucas (que não quis divulgar seu sobrenome e se manter anônimo na matéria) foi um dos fãs que conseguiu ser rápido no momento da liberação de pré-venda e garantiu um PS5 e um DualSense na edição comemorativa de 30 anos. Entretanto, na hora da entrega, essa felicidade escorreu pelo ralo.
Imagem: PlayStation
Comprados na Amazon Brasil, Lucas teve uma surpresa negativa. O DualSense foi entregue pela própria Amazon e estava bem-embalado, mas o console que ainda restava, que seria entregue pela Loggi (empresa de entregas), acabou se tornando um pesadelo: em vez de receber o console comemorativo, o consumidor recebeu entulho no lugar. Entenda a história abaixo.
PS5 de 30 anos é trocado por entulho em compra da Amazon
Em conversas com o Flow Games, Lucas explicou que já estava achando estranho o processo de entrega. Inicialmente, a Loggi informou que o endereço estava errado (apesar de os dados baterem corretamente) e que não faria a entrega. Nesse período, a compra entregue pela própria Amazon chegou e estava certa (no caso, o DualSense).
Contudo, a Loggi atualizou o status da entrega duas horas depois e entregou o pacote. Lucas achou estranho todo o processo, especialmente ao coletar a entrega na portaria: a caixa era leve, tinha sinais de rompimento do lacre e havia barulhos dentro do pacote.
Imagem: Lucas/Reprodução
Já imaginando que algo estava errado e que não era o PS5 na edição de 30 anos, o consumidor gravou todo o processo de abertura da encomenda para ter ainda mais respaldo jurídico caso encontrasse algo fora de ordem. E foi justamente isso que aconteceu.
Dentro do pacote, havia a caixa do PS5, mas ela não estava lacrada e dentro estava recheada de entulho, com torneiras, garrafa de óleo e outros tipos de lixos apenas para agregar peso à encomenda.
Escolhi a Amazon por ser uma das 3 revendedoras oficiais mencionadas pela Sony na pagina de divulgação do PS5 de 30 anos. Acreditei que estava seguro, e que minha maior dificuldade seria a corrida com os scalpers, mas fui surpreendido. A frustração é inexplicável”
Como qualquer outro consumidor, Lucas está assegurado pela Amazon em ter o reembolso (mesmo se não tivesse gravado a entrega), mas há uma dúvida em casos como esse: neste momento, não há estoques de reposição e o valor pago pelo usuário não compra mais um produto igual. Como proceder agora?
O consumidor tem opções além do reembolso?
Para entender mais sobre o direito do consumidor em ocasiões como essa, o Flow Games conversou com Filipe Prado, advogado da Prado Advocacia Space (e que já contribuiu conosco em outras matérias), para entender quais são as opções que um usuário lesado pela entrega pode tomar.
A primeira opção – e a protocolar – é entrar em contato com a rede varejista, explicar o caso e mandar provas do ocorrido para garantir o reembolso. Em setembro, quando o PS5 na edição de 30 anos entrou em pré-venda, o valor era de R$ 4.299,99.
Imagem: Sony
De acordo com Código de Proteção e Defesa do Consumidor, trata-se de uma relação de Consumidor x Fornecedor (empresa e cliente) e a responsabilidade é solidária entre Amazon e Loggi, ou seja: não importa de quem é a culpa, qualquer uma delas deve arcar com os custos e estornar o dinheiro ao consumidor.
E, como relatamos, Lucas filmou o processo de abertura da caixa do PS5 na edição de 30 anos, mas esse é um respaldo extra, já que em uma relação Consumidor x Fornecedor, há a inversão do ônus da prova: caso haja uma contestação, é a Amazon ou a Loggi quem devem provar que não foi um golpe – em vez de o consumidor ter que provar que foi lesado.
De qualquer forma, isso pouco importa e é onde as coisas começam a ficar complicadas. Para quem queria a edição comemorativa de 30 anos do PS5, ter o reembolso ainda não serve, já que o item está esgotado e no mercado paralelo o valor chega a ser duplicado ou até triplicado. Não há mais estoques do produto e no momento de publicação desta matéria, o preço do aparelho é de R$ 9 a 12 mil no mercado paralelo.
Em casos específicos como esse, há algo que o consumidor possa fazer por ser lesado na entrega? Segundo Filipe Prado, sim. Por se tratar de um item infungível, ou seja, “insubstituível”, o consumidor pode entrar com um processo pelo dano sofrido através dos Juizados Especiais (ou também comumente conhecido como “pequenas causas”) se o valor não ultrapassar 40 salários-mínimos.
Apesar de ser um aparelho eletrônico, o PS5 na edição comemorativa de 30 anos foi um item escasso em escala global. A Sony não chegou a divulgar o número do PS5 base, sabemos que o modelo Pro teve apenas 12.300 unidades fabricadas.
Por conta disso, entende-se pela legislação civil que se trata de um item que não pode ser substituído com facilidade e ainda pode ter valor cultural, emocional ou de exclusividade (e eles não são excludentes, ou seja, o item pode ter os três valores simultaneamente).
Art. 85, CC: São fungíveis os móveis que podem substituir-se por outros da mesma espécie, qualidade e quantidade.
Art. 86, CC: Não se pode alienar nem substituir, sem prejuízo, os bens considerados infungíveis.
De acordo com Filipe Prado sobre o caso:
Se você comprou algo muito especial e exclusivo, como um item colecionável esgotado, e ele não pode ser substituído sem gastar uma fortuna ou pagar um valor muito maior do que o original, ele pode ser considerado infungível para o Direito. Isso significa que, para você, ele não tem um substituto fácil. O PS5 pode, então, ser visto como infungível não porque seja impossível de substituir, mas porque a substituição seria muito difícil ou extremamente cara. Mesmo um produto fabricado em série pode ganhar esse aspecto de infungibilidade em situações específicas”
Segundo Prado, isso também é contemplado em artigos do código civil brasileiro, conforme você confere abaixo:
Art. 389: Não cumprida a obrigação, responde o devedor por perdas e danos, mais juros e atualização monetária segundo índices oficiais regularmente estabelecidos, e honorários de advogado.
Artigo 944: A indenização mede-se pela extensão do dano.
Imagem: Lucas/Reprodução
Além de a justiça determinar que o valor total do produto deve ser ressarcido, custos extras com o preço atual do console também seriam inclusos – além de potenciais danos morais ao comprador. De acordo com Filipe Prado:
Assim, a perda de um item como esse pode justificar a fixação de valores de reparação que levem em conta tanto o preço de mercado quanto a relevância simbólica para o credor, ou seja, deve-se considerar o valor atual de mercado, ainda que disponível em preços elevados em mercado secundário. Além disso, a jurisprudência brasileira reconhece que, em casos como esse, os danos materiais e morais devem ser avaliados sob uma ótica mais ampla. Em outras palavras, o consumidor tem o direito não apenas ao ressarcimento financeiro, mas também à compensação pelos impactos emocionais e simbólicos sofridos”
Em conversa com o Flow Games, Filipe Prado comentou que as indenizações semelhantes no Tribunal de Justiça de São Paulo têm variado entre R$ 10 mil a R$ 12 mil a título de danos morais (não necessariamente são esses valores, mas são referências).
Ademais, é cabível a demanda por indenização por danos morais, especialmente quando o bem adquirido possui elementos de exclusividade ou valor sentimental significativo. Nesse contexto, a jurisprudência e os dispositivos legais garantem ao consumidor o direito à reparação integral, contemplando tanto os danos materiais quanto os morais, sempre considerando a extensão real do dano sofrido”
Por fim, Prado também comentou que soube de outros três casos na Bahia, todos do PS5 ou DualSense comemorativo de 30 anos e com entrega feita via Loggi. Em casos como esse, os consumidores podem entrar com uma ação coletiva contra a companhia.
Ao consultar o Reclame Aqui, vemos múltiplos casos semelhantes ao longo de 2024, como entregas extraviadas, produtos dados como entregue, mas sem o consumidor receber a mercadoria, encomendas entregues para endereços errados e muito mais.
Imagem: Reclame Aqui
Em resumo, caso a compra fosse de um PS5 comum, estaríamos falando de um bem fungível e facilmente substituível, mas esse não foi o caso. O PS5 na edição de 30 anos está esgotado (ou seja, a loja não pode enviar outro produto) e, onde pode ser encontrado, é muito mais caro. E, em casos como esse, o consumidor pode procurar seus direitos.
O Flow Games entrou em contato com a Amazon para um posicionamento sobre o ocorrido e vamos atualizar essa matéria caso haja novidades.