“Cortina flutuante” na Antártida pode provocar crise diplomática; entenda
Um novo estudo sugere que a ideia de construir uma “cortina” flutuante de 100 metros de altura ao longo de 80 quilômetros de camadas de gelo na Antártida Ocidental pode ser o estopim para uma crise diplomática nunca vista antes.
O plano foi apresentado no início do ano em artigo na Nature e avaliado recentemente por pesquisadores da Escola de Pós-Graduação em Estudos de Cooperação Internacional da Universidade de Kobe (Japão).
O megaprojeto de geoengenharia foi apresentado por uma equipe finlandesa com o objetivo de salvar a camada de gelo do derretimento, que pode elevar o nível do mar em até cinco metros. A ideia é impedir que a água subterrânea quente atinja as geleiras.
No novo artigo, os analistas consideram três aspectos políticos que, segundo eles, foram “completamente ignorados ou perigosamente minimizados” da proposta de caráter científico: autoridade, soberania e segurança.
“No clima atual, com crescente rivalidade internacional e competição estratégica de grande potência, seria uma conquista diplomática extremamente improvável garantir o nível de cooperação internacional necessário para as infraestruturas de geoengenharia glacial propostas”, diz o estudo.
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Proposta não considera desafios de governança para brecar o degelo da Antártida
No início da década de 1980, um imbróglio sobre a extração de minerais da Antártida foi desfeito a partir do “Protocolo de Proteção Ambiental ao Tratado da Antártida” de 1991;
O acordo proibiu a mineração na região por tempo indeterminado, abrindo precedente para soluções futuras sobre conflitos na Antártida, na avaliação dos pesquisadores;
No campo diplomático, Argentina, Austrália, Chile, França, Nova Zelândia, Noruega e Reino Unido reivindicam territórios na região, mas o Tratado da Antártida (ATS) de 1959 “congelou” qualquer avanço e preservou o espaço para explorações pacíficas.
“Cada vez mais, no entanto, o ATS isolado e ‘excepcional’ está sendo pressionado por novos desafios regulatórios emergentes, como aqueles relacionados à bioprospecção ou turismo, bem como pela crescente competição de grandes potências em todo o mundo, enquanto a diplomacia antártica se tornou bastante lenta.”
O artigo pondera que as 29 nações consultivas do tratado não deverão ficar isoladas na preservação ambiental relacionada às mudanças climáticas, como o derretimento das geleiras que a “cortina” pretende evitar.
“As nações insulares do Pacífico teriam voz se os emissores do Norte global considerassem ‘salvá-los’ da elevação do nível do mar por meio da conservação da camada de gelo? Portanto, há uma necessidade de discutir essas questões incertas e inquietantes de autoridade e legitimidade mais profundamente”, questionam os pesquisadores.
Futuramente, mesmo que a proposta seja tecnicamente viável e ambientalmente inofensiva, os desafios políticos e legais são significativos para a governança na Antártida. “Apelamos aos proponentes da geoengenharia glacial para que considerem esses riscos subestimados para o ATS de forma mais abrangente e séria”, conclui o artigo, publicado na International Affairs, pelos professores Akiho Shibata e Patrick Flamm.
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